Pode até ter levado um tempo enorme, pois
a banda data de 1998, mas o primeiro álbum do Tormenta (Thrash
Metal de Ribeirão Preto-SP) finalmente chegou. No entanto, apesar de terem se
unido há mais de vinte anos, os paulistas tiveram duas pausas em sua história.
De 2002 a 2005 e de 2008 a 2010, portanto, aproximadamente cinco anos de
inatividade nos vinte e um de existência. "Batismo da Dor"
é o debut album, mas o segundo registro da banda, que conta com um EP lançado
de maneira independente em 2006.
Treze anos depois e em grande estilo surge
o principal trabalho da Tormenta, com uma atenção especial dedicada à parte
visual do full. Digipack bem trabalhado, com citações de Shakespeare, Goethe,
Gandhi, José Saramago e outros antecedendo as letras das músicas no encarte,
além de uma capa que traz uma escultura do artista italiano Enrico Ferrarini. A
obra, intitulada "Urlo", ("urro" ou "grito" em
italiano) permite reflexões a respeito de expressões e sentimentos, como um
subconsciente berrando por trás de uma máscara socialmente aceita. A escultura
somada às citações escolhidas pela banda, agregam positivamente ao trabalho
como um todo e o deixam mais complexo e até intelectual.
Gravado, mixado e masterizado por Rômulo
Felício (Necrofobia) e Rogener Pavinski (guitarra e vocal da Tormenta) no Under
Studio em Ribeirão Preto-SP, o álbum foi produzido pela própria banda e à exemplo de seu primeiro EP, as letras
são todas cantadas em português. O trabalho é composto de dez faixas, sendo
duas instrumentais e um cover.
Já de cara, fica evidente uma das
principais qualidades aqui: o profissionalismo. A musicalidade e o modo como
ela foi captada, o nível das composições e até mesmo a seriedade com que os
músicos encaram a empreitada é algo nítido. "Cumulonimbus" é uma
introdução instrumental com riffs melódicos e em grande harmonia. A maneira
como se complementam é muito bem construída e realmente chama a atenção. Baixo
e bateria injetam peso e groove na medida e toda a banda esbanja técnica e conhecimento
dos instrumentos.
É interessante notar como a banda dosa bem
as influências na hora de compor, pois possui elementos pesados e rápidos,
cadenciados e melódicos, modernos e old school e tudo isso pode estar em uma
única composição, entregando ao fã um belo resultado sem soar nada forçado. É
fato que o gênero adotado pela banda é o Thrash Metal e trata-se de um estilo
pra lá de saturado e, no entanto, "Batismo da Dor" não é nem de longe
um álbum datado, ultrapassado ou somente mais do mesmo. Os ribeirão-pretanos se
empenharam em entregar um full-length com criatividade e alma. E conseguiram.
Tudo está lá: a gana do vocal, as palhetadas rápidas e certeiras das guitarras
e o peso e a condução da cozinha. Esse é um daqueles álbuns pra você mostrar
pra quem diz que metal não soa bem em português, pois essa é a prova cabal de que o
nosso idioma casa muito bem com riffs pesados e velozes, mas experiência e
competência são de suma importância para um bom resultado. Além disso, a
honestidade ao interpretar as letras faz a gana transparecer e soar natural.
Tormenta (2019) |
Todo o álbum mantém um alto nível, sem oscilações ou faixas fora de contexto. É realmente muito bom do início ao fim. Abaixo falo um pouco das que mais se destacaram para mim.
A faixa-título "Batismo da Dor" que virou Lyric Video recentemente tem refrão e outros trechos marcantes. A ponto de você se pegar cantando depois de ouví-la míseras duas vezes. O título é excelente e mereceu batizar o álbum. Aqui temos um dos melhores riffs do CD;
“Reféns do Medo” tem um início mais melódico e dá a impressão de ser uma música menos pegada. Ledo engano, o peso e o groove aparecem com imponência e também possui um ótimo refrão;
"Em Nome de Deus", com críticas à líderes religiosos charlatões e à própria religião tem uma veia Speed Thrash e é uma das mais empolgantes. Daquelas em que você se vê obrigado a meter o volume no talo. Os pedais duplos unidos às palhetadas e a levada mais compassada e pesada são alguns dos grandes pontos;
“Dono da Verdade” tem um andamento muito legal e é uma das mais bem produzidas. Possui uma das letras mais interessantes e, sem querer soar repetitivo, mas, que refrão! Com direito até a adaptação do famoso texto “já não havia ninguém para protestar” de Martin Niemoller;
“A Noite Espessa” é uma música introspectiva e profunda que fala sobre tristeza, depressão e solidão e somente pela versatilidade criativa da banda, já mereceria entrar em destaque, mas, além disso, é uma composição forte, com sentimento e honestidade. Letra e instrumental casam com perfeição nessa que é uma das mais complexas e envolventes músicas do álbum, coincidência ou não, é a mais longa, com seis minutos de duração.
Por último, não poderia encerrar essa resenha sem mencionar o cover escolhido. "Mal Necessário" de Ney Matogrosso. Uma escolha inteligente, que valoriza a cultura nacional e que foge do óbvio. A música ganhou uma roupagem fenomenal e, no entanto, toda a essência da obra original está lá. É mais um exemplo do profissionalismo da Tormenta, pois souberam criar algo novo em cima de um clássico, respeitando e mantendo a sonoridade de Ney Matogrosso e Tormenta. Certamente o próprio cantor apreciaria a homenagem.
O álbum está disponível nas versões física (digipack) e digital. Confira abaixo:
Versão física:
Tormenta Site Oficial
Digital:
Deezer
Google Play
iTunes
Spotify
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